quarta-feira, 8 de julho de 2009

LUTA DA REDE SOCIAL DA CEILÂNDIA PELA IMPLANTAÇÃO DOS CAPS

LUTA DA REDE SOCIAL DA CEILÂNDIA PELA IMPLANTAÇÃO DOS CAPS O tema CAPS surgiu no encontro da Rede realizado em agosto de 2008, quando o padre Moacyr questionou acerca de um membro da paróquia que lhe solicitava recursos financeiros para custear o transporte coletivo para se tratar da dependência do álcool numa entidade do governo no Guará. Os profissionais presentes que conheciam a proposta dos CAPS explanaram aos participantes acerca desse serviço substitutivo para acompanhamento aos usuários da saúde mental. Ao compreender o que são os CAPS, ele questionou porque não havia este serviço em Ceilândia. Seguiu-se uma discussão acerca da não execução por parte do Estado das diversas políticas públicas – principalmente, sociais, saúde e educacionais – asseguradas em lei. O debate que se seguiu foi extremamente rico ao analisar várias facetas da não existência de equipamentos públicos numa cidade do porte de Ceilândia. A saúde mental foi enfocada pelo seu aspecto transversal em relação à violência, aos conflitos familiares, ao abuso e dependência do álcool e de outras drogas, etc. Um agente comunitário de justiça e cidadania do Programa Justiça Comunitária questionou se a Rede Social da Ceilândia não poderia ser um espaço para articular mobilizações em torno dos direitos coletivos que não estão garantidos nessa comunidade. O grupo avaliou que a formação de um propósito coletivo poderia trazer ganhos para a comunidade, mas que as pessoas participantes deveriam ter liberdade pela decisão de participar ou não. Dentre as várias políticas públicas que o Estado não vem executando, decidiu-se então, que a primeira mobilização seria em torno da saúde mental, especificamente o em torno dos CAPS, devido a ampla discussão que foi promovida pelo grupo. Sabe-se que as redes contribuem para engendrar as precondições de mobilização, uma vez que o movimento social constitui-se a partir da teia de interações informais estabelecida por uma pluralidade de indivíduos, grupos e organizações. O sonho coletivo e o desejo compartilhado de ter em Ceilândia um serviço substitutivo ao modelo hospitalocêntrico para atendimento das pessoas em sofrimento psíquico ensejou a luta pela implantação dos CAPS na cidade. Como estratégia de consolidação do movimento e objetivando envolver o serviço público que presta atendimento em saúde na Ceilândia foi deliberado que o encontro da rede aconteceria no auditório do Hospital Regional da Ceilândia (HRC). Outra deliberação foi que seriam convidados interlocutores que tinham poder de negociação e de decisão, tais como o diretor do HRC, o Gerente de Saúde Mental da Secretaria de Saúde, o promotor-chefe do Ministério Público da Ceilândia, os operadores da saúde mental no DF e a coordenadora do Movimento Pró-Saúde Mental do DF. A fim de oportunizar aos integrantes da rede um maior conhecimento do que são os CAPS e as portarias que o regulamentam, resolveu-se enviar para todos pela internet, os slides utilizados pela professora Tânia Grigolo na sua aula de Políticas Públicas de Atenção Psicossocial: Saúde Mental e Reforma Psiquiátrica no curso de Especialização em Saúde Mental da UNB. O encontro da rede no HRC contou com a participação de 74 pessoas, que representavam serviços públicos, ONGs, grupos religiosos e lideranças comunitárias, destacando expressiva presença de servidores da saúde. O movimento contou com o apoio do diretor do Hospital, Dr. Baelon Pereira Alves, do promotor-chefe do Ministério Público da Ceilândia, Dr. Thiago Pierobom, e da coordenadora do Movimento Pró Saúde Mental do DF, Dra. Eva Faleiros. Na sua fala, o Dr. Thiago Pierobom informou que desde o início do ano já estava em comunicação com o poder executivo e legislativo do DF, para recomendar a implantação dos CAPS em Ceilândia, conforme previsto na política nacional de saúde. Destacou que estava articulando uma Audiência Pública com a Câmara Legislativa, para propiciar o debate da necessidade da população ser atendida por esses serviços, a ser realizada no Fórum de Ceilândia, em outubro. O promotor sugeriu, ainda, a elaboração de um abaixo-assinado para solicitar ao governador do DF a instalação dos CAPS na Ceilândia. Dr. Baelon Alves ressaltou que a Secretaria de Saúde estava atenta à questão em pauta e que, nesse mesmo dia teria um reunião com o Secretário de Saúde, no qual repassaria que vários segmentos da cidade estavam se articulando para solicitar a implantação urgente dos CAPS. Foi sugerido que ele apresentasse a lista de presença do encontro deste dia, como forma de conhecimento concreto da Rede Social de Ceilândia. A professora Eva Faleiros destacou que no DF existem pouquíssimos e insuficientes recursos para o atendimento aos usuários da saúde mental e que o Movimento Pró Saúde Mental mantém um trabalho em rede para pressionar a implantação de todos os serviços substitutivos previstos na Reforma Psiquiátrica. Sugeriu que a Rede Social da Ceilândia prioridades de ação. Alguns servidores da saúde relataram suas angústias pela falta dos serviços substitutivos em saúde mental: que existe apenas um ambulatório de psiquiatria no HRC, insuficiente para atender à demanda; que já houve uma experiência de atendimento aos dependentes de álcool em outras drogas em um Centro de Saúde da cidade que foi desmantelado; que haviam pessoas designadas para o CAPSad da Ceilândia há mais de um ano e que ficavam ociosas dentro do HRC; que no HRC funciona um grupo de Terapia Comunitária e que a direção precisa garantir a sua continuidade, etc. O encontro no HRC, além de motivar outras pessoas para a construção de um projeto comum, serviu como base para definir as ações que viriam posteriormente na luta pela implantação dos CAPS. Para Franco (2008, p. 5): “Uma articulação em rede é uma forma de organização. Uma organização é uma comunidade de projeto conformada a partir de uma identidade. Uma comunidade de projeto se forma em torno de um sonho coletivo, de um desejo compartilhado, de uma visão de futuro e, a partir daí, formula sua missão ou propósito e elabora seus valores ou princípios. O que a caracteriza é uma causa e um modo peculiar de ser e de agir.” Foi ainda deliberado nesse encontro, ainda, que os integrantes que quisessem e pudessem buscariam novas formas de divulgação da Rede Social da Ceilândia, convidariam à adesão o maior número possível de pessoas e fortaleceriam a comunicação pela internet para possibilitar o fluir das informações. Para SOUZA (2007, p.109): “Os direitos coletivos são a grande marca de um acesso de qualidade democrática numa sociedade muito desigual. Se não houver direitos coletivos, nunca serão reduzidas as enormes desigualdades deste país.(...) Não há mobilização jurídica sem mobilização política. A mobilização jurídica de cidadania, de direitos coletivos, só pode existir se houver mobilização política.” Esta mobilização jurídica e política, preconizada por Sousa Santos, ocorreu no dia 14 de outubro na Audiência Pública organizada pela Promotoria da Ceilândia e pela Deputada Erika Kokay, Presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Legislativa do Distrito Federal. Esta audiência teve como objetivo principal a realização do debate para discutir a implantação de Centro de Atenção Psicossocial para usuários de álcool e drogas em Ceilândia. A mesa dessa Audiência Pública foi composta por quinze pessoas: “O Terceiro Secretário da Câmara Legislativa do Distrito Federal, Deputado Dr. Charles; o coordenador administrativo da Promotoria de Justiça de Ceilândia, Sr. Thiago André Pierobom de Ávila; o Juiz de Direito do 1º Juizado Especial Criminal de Ceilândia, Dr. Carlos Bismarck Piske de Azevedo; a Promotora de Gênero da Promotoria Núcleo Pró-Mulher, Dra. Laís Cerqueira Silva; a Promotora da Promotoria da Infância e Juventude, Dra. Leslie Marques de Carvalho; o Psicólogo da Secretaria Nacional de Segurança do Ministério da Justiça, Dr. João Bosco Rodrigues; o assessor jurídico da Secretaria Nacional de Segurança Pública, Dr. Daniel Meireles da Rocha; a representante da Secretaria Nacional de Política sobre Drogas, Dra. Carla Dalbosco; o gerente de saúde mental do Distrito Federal, Dr. Leonardo Gomes Moreira; a Delegada da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher, Dra. Sandra Gomes Melo; o Presidente do Conselho de Política sobre Drogas do Distrito Federal, Dr. João Marcelo Mendes Feitoza; o Revmo. Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Assunção, Padre Moacir Gondim, que aqui representa a Rede Social de Ceilândia (inaudível); o Tenente do 8º Batalhão de Polícia Militar, representando o Sr. Comandante Fábio Pereira. Informo a todos que o Administrador de Ceilândia, Sr. Leonardo Moraes, foi convidado a participar deste debate, esteve aqui, aguardou por um período, mas teve de se retirar, a quem agradecemos a presença.“ A Audiência Pública contou com a participação de cerca de 300 pessoas, sendo que a Deputada Erika Kokay, coordenadora da mesa, abriu inscrição para cinco pessoas do plenário manifestassem suas idéias. Estavam presentes na Audiência usuários do Hospital São Vicente de Paulo, do Programa “De Volta para Casa” e do CAPS/Guará. Alguns desses usuários se mobilizaram para confeccionar camisetas e um banner com os dizeres: CAPS JÁ – Ceilândia: 500 mil habitantes sem serviço em saúde mental (Anexo 1). Estes mesmos usuários fizeram, na hora, diversos papéis com a chamada CAPS JÁ e distribuíram para os demais participantes. A Deputada Érika Kokay trouxe na sua fala: “A necessidade de haver uma atenção à saúde mental no DF. E que seja uma atenção dentro dos paradigmas colocados pela reforma psiquiátrica. (...) Por isso, é preciso que nós possamos nos apropriar de uma reforma psiquiátrica que rompa com a lógica manicomial, rompa com a lógica dos manicômios como “paredes sombrias” que impedem o exercício da condição humana das pessoas acometidas por transtorno mental. (...) Aqui no DF existem seis CAPS. (...) Há a necessidade de abrir-se um CAPS em Ceilândia! E falo isso porque o CAPS/AD de Ceilândia é um aspecto que tem um simbolismo muito grande. Há um CAPS em Taguatinga. Este CAPS foi uma luta do André, da Eva, da Anunciação, das marias, dos joões, que se uniram e pressionaram o Estado para que em Taguatinga houvesse um CAPS. (...) Por fim, eu gostaria apenas de dizer que nós estamos aqui hoje para que haja a fala de vários representes de Ceilândia, de vários representantes do DF. Uma fala com várias leituras diferenciadas. E que possamos também caminhar para a efetivação dessa reforma aqui no Distrito Federal. Precisamos do CAPS/AD em Ceilândia. Precisamos do CAPS para a infância e a adolescência. Precisamos do CAPS/ADI, “álcool e drogas para a infância e adolescência”, porque 98% dos meninos que estão no CAJE tiveram a droga como uma variável importante para que entrasse na vida infracional.” Logo a seguir, Dr. Thiago Pierobom se manifestou: “(...) É muito importante que a população de Ceilândia mostre para seus representantes no Governo que ela tem consciência dos seus direitos e que está preocupada com a melhoria de qualidade de vida da cidade, com o incremento do seu potencial de desenvolvimento. (...) Trabalhamos com violência doméstica em Ceilândia e constatamos que lá, em mais da metade dos casos de violência doméstica, há uma relação e constatamos que mais da metade dos casos tem relação direta ou indireta com o uso e o abuso de álcool e de drogas. (...) Portanto, nós, representantes do Estado, temos obrigação com essa comunidade de Ceilândia e precisamos dar uma resposta que não seja meramente simbólica, que seja eficiente e capaz de atingir as raízes desse problema. (...) A segunda maior recomendação do Ministério da Saúde é que toda cidade de vinte a setenta mil habitantes tenha pelo menos um CAPS; acima de duzentos mil habitantes, três CAPS: o geral, o de infância e o de álcool e drogas. Em Ceilândia, segundo o último levantamento da Polícia Militar, registraram-se quinhentos e oitenta e cinco mil habitantes, já se aproximando de seiscentos mil habitantes. Portanto, já seriam necessários três CAPS.(...) Se alguém puder me explicar o porquê disso, eu gostaria de entender. Essa omissão do poder público quanto ao fornecimento de políticas eficientes para a comunidade de Ceilândia tem dado o resultado que podemos ver, todos os dias, nas ruas. (...) Quero dizer que o Ministério Público está atento a essa omissão e, por isso, convidamos a comunidade de Ceilândia a se manifestar nesta manhã. (...)Hoje é um momento histórico, um momento onde a comunidade passa a exigir os seus direitos do Estado. Esperamos que os representantes do Governo do Distrito Federal, da Câmara Legislativa, do Poder Judiciário, do Ministério Público e das polícias que estão aqui presentes, cada um na sua esfera de atribuição, possam envidar esforços para, efetivamente, sair do papel e entrar na prática essa política de atendimento psicossocial. Agora, gostaríamos de ouvir a população e o que vocês têm a pedir e exigir dos representantes que estão aqui nesta manhã.” O Gerente de Saúde Mental do Distrito Federal, Dr. Leonardo Gomes Moreira, vestiu uma camisa CAPS JÁ e falou da tribuna: “Dividirei a minha fala em dois breves momentos. Espero não assustar muito. Em primeiro lugar, falamos aqui de CAPS. O que é um CAPS? É um local destinado aos pacientes portadores de doença mental severa. O colega fez a conta de que há na Ceilândia aproximadamente de 30 a 40 mil pessoas portadoras de severos transtornos relacionados ao álcool e a drogas. Isso demandaria em assistência mais de cem CAPS para a Ceilândia. Podemos pensar: “Há algo errado? Estamos no caminho errado? Não será assim?” Não! Os CAPS farão o matriciamento da rede. A Ceilândia já tem capacitação neste mês e já ultrapassamos a marca de dez regionais capacitadas em saúde mental para formar uma rede entre o CAPS, o ambulatório de saúde mental, leitos em Hospital Geral e a assistência específica do CAPS. Haverá só um CAPS/AD para a Ceilândia? De jeito nenhum. Existe uma política pública em saúde mental para o GDF que preconiza com urgência quatro CAPS para a Ceilândia até o final de 2009. Tudo isso consta na lei. Existem algumas deficiências e alguns entraves. Eu devo deixar isso bem claro como cidadão que veste a camisa “CAPS JÁ”, colocando-me agora um pouco à parte do papel de gestor. Não quero mais ver até onde vou como gerente de saúde mental e as coisas não acontecerem. Faço um apelo para que, na QNP 24/28, comece o funcionamento do CAPS/ AD já. (...) Convocamos todos os psiquiatras concursados. Conseguimos oito. Apenas cinco se apresentaram, mas precisamos convocar o restante dos psiquiatras, pois são muito poucos. Há a necessidade urgente de concurso para psicólogos. (...) Desde 2006, estamos animados com a mudança da saúde mental e dos paradigmas da saúde mental e hospitalar. Já os modificamos, já existe uma política pública, mas precisamos efetivá-los. Com a ajuda de vocês, coloco-me como cidadão para concluirmos e conseguirmos isso. Muito obrigado.” Dos participantes do plenário, destacam-se algumas manifestações: • Sr. Ivonaldo Vieira, estudante de Psicologia e líder comunitário do PSul “A nossa satisfação e a nossa alegria em poder estar aqui dizendo a nossa população que somente por meio da nossa mobilização e da nossa participação conquistaremos espaço. (...) Eu, Ivonaldo, sou aluno de Psicologia da UNIP e morador de Ceilândia. Não se pode falar e pensar em Psicologia sem se discutir e envolver questão política, pois a Psicologia tem uma proposta de inclusão social. Eu, na qualidade de morador de Ceilândia, não poderia perder o privilégio, a satisfação e a alegria de estar aqui junto com a nossa comunidade, mostrando às nossas autoridades a necessidade que temos. (...) É para já. CAPS JÁ! • Sra. Josineide de Souza, Presidente do Conselho de Saúde de Ceilândia “Sou Josineide, Presidente do Conselho de Saúde de Ceilândia. Sou moradora daqui há trinta e sete anos e servidora da Secretaria de Saúde há trinta anos. (...) Sabemos da necessidade do CAPS na nossa cidade. (...) Quero ainda lembrar que nos faltam, Deputada e toda a Mesa, profissionais. Nós precisamos de psiquiatras, terapeutas ocupacionais, enfermeiros, auxiliares e técnicos de enfermagem e psicólogos, Então o meu recado é esse. Não adianta implantar sem que haja profissionais. (...)” • Sr. José Alves, Presidente do Grupo dos Amigos do Hospital São Vicente de Paulo “Nós viemos aqui hoje, dar o primeiro passo, nessa nossa história, para a construção do CAPS da Ceilândia - aqueles que não vieram perderam – e, construindo esse nosso, construiremos o de Samambaia – que é onde moro, eu preciso de um lá -, o do Riacho Fundo, o de Recanto das Emas e os de outras cidades. Todos esses lugares dependem apenas do São Vicente de Paulo, e lá é uma unidade tão pequena que a gente se sente preso lá dentro. (...) Eu não acredito que seja um lugar bom para ficar, porque você já está com problema de saúde, vai atrás de um melhora para a sua vida e você fica preso. Acredito que quem fica preso não fica legal. (Palmas.) Eu não entendo - desculpem-me pela intransigente - mas é um desrespeito não haver um CAPS aqui, na Ceilândia, quando deveria haver três, porque já há meio milhão de habitantes constatados, mas pode ser mais. Por que não há o CAPS, se está dentro da lei e, até hoje, não foi construído? Da minha parte, considero um desrespeito com a gente, usuário da Saúde Mental. (...) Queremos CAPS nas cidades, não só aqui,- na Ceilândia, porque assim teremos atendimento digno, de que precisamos, pois somos humanos, como qualquer um. Dependemos deste atendimento digno.” • Sra. Márcia Lima “Agradeço a oportunidade. Eu sou paciente do CAPS do Guará II, sou dependente química e tive um momento em que não tinha mais vontade de viver total. Um colega meu que se trata lá também me levou e hoje eu estou me sentindo bem graças a eles. Eu só tenho a agradecer. Muito obrigada.” • Pe. Moacyr Gondim, pároco da Paróquia Nossa Senhora Assunção, que representa aqui a Rede Social de Ceilândia “É uma grande alegria compor a Mesa, com os representantes interessados pelos valores de nossa sociedade. Como rede, desde o início deste ano, na Ceilândia, estamos crescendo, tentando mobilizar todos os setores de nossa sociedade para lutar juntos, exigir juntos, como foi colocado, constatar juntos e encontrar os meios justos e honestos para que tantas coisas sejam superadas em nossa sociedade.” Cabe ressaltar, que esta Audiência Pública teve o caráter explícito de debater a implantação do CAPS na Ceilândia. Porém, alguns participantes da mesa e do plenário chamaram a atenção para a necessidade de assegurar para a cidade o estabelecimento de todos os CAPS previstos em lei. Após esta Audiência foi realizada a reunião prevista para o mês de outubro da Rede Social da Ceilândia no Centro de Ensino Médio 2, no qual foram deliberadas as próximas estratégias para a continuidade e fortalecimento do Movimento Pró CAPS Ceilândia. A representante do Ministério Público da Ceilândia levou um esboço do abaixo-assinado para aprovação e/ou modificações pertinentes. Após a aprovação, ficou acertado que seriam enviados via e-mail para os participantes da Rede ou quem tivesse dificuldade para a impressão, o Ministério Público disponibilizaria o número de cópias que fossem solicitados (Anexo 2). A presidente do Conselho de Saúde da Ceilândia, disponibilizou-se a divulgar na próxima reunião do Conselho o empenho da Rede Social da Ceilândia para a implantação dos CAPS, a convocar mais conselheiros a participarem e a divulgar na Rádio Comunitária o que são CAPS e as datas dos eventos. Outros encaminhamentos foram decididos nesse encontro, quais sejam: realizar um Abraço Simbólico em torno do prédio que está previsto para o funcionamento do CAPS, no dia 15/11/08; elaborar e distribuir um panfleto com uma explicação breve acerca do que são os CAPS para a população, explicitando as datas e locais das manifestações; criar um folder mais elaborado sobre CAPS, também para informação à população; criar uma logomarca para a Rede Social da Ceilândia; lançar o Movimento Pró CAPS Ceilândia com um grande evento. O Abraço Simbólico ocorreu na data prevista com a participação de cerca de cento e cinqüenta pessoas, de diversos segmentos da sociedade. Um jornal impresso noticiou a proposta, uma rede de televisão esteve presente e exibiu no jornal local a matéria, o Ministério Público e o Gabinete da Deputada Érika Kokay divulgaram em seus sítios tal evento. A palavra foi franqueada a todos os participantes e duas serão reproduzidas: “Para apoiar principalmente a necessidade de ter um CAPS na Ceilândia, nós do Programa Justiça Comunitária, sentimos a necessidade de encaminhar os adolescentes e as pessoas que lá chegam com a demanda, mas nós não temos para onde encaminhar essa demanda. Por isso, a Justiça Comunitária vem juntamente com a Rede Social da Ceilândia fortalecer essa solicitação. Isso é fundamental para a participação da comunidade, da população do Setor PSul já que essa área está desocupada a algum tempo. Existe a necessidade do espaço fisico para que se crie o CAPS no setor PSul. Por isso o Programa Justiça Comunitária apóia esta iniciativa da Rede e conta também com o apoio da população em especial para que nós possamos conseguir êxito, que é trazer o CAPS para a Ceilândia.” (Agente Comunitário de Justiça e Cidadania) “As pessoas precisam dos CAPS porque vão ter saúde, vão poder estar trabalhando junto com vocês aqui também. Então, é isso ai que eu digo para vocês, não tenham medo de receber essas pessoas que são seus vizinhos e seus familiares. Vocês, também, estão sujeitos a ter problemas de saúde e o que nós pedimos é que a pessoa que venha a ter um surto, um problema de saúde mental, tenha um lugar capacitado para tratar dos seus filhos dos seu irmãos ou ate mesmo de você. Todos nós podemos ter problemas, eu mesmo não nasci com problema de saúde e hoje eu sou uma pessoa que faço tratamento. Por que? Eu esperei isso acontecer comigo? Não! A vida é assim! Se Deus nos cria ou nos dá o destino da gente conforme a gente tem de ter. E eu , Deus me deu o destino de estar fazendo tratamento. Vou passar minha palavra para uma colega minha que luta também. Ela vai explicar prá vocês, que além de a gente estar lutando, a gente também tem conhecimento da lei, o que nos dá direito de estar aqui de olho. Por isso, nós viemos!” (Usuário do Hospital São Vicente de Paulo) Nos encontros ocorridos nos meses de novembro e dezembro da Rede Social da Ceilândia foram avaliados os eventos e decidido que o folder e o lançamento do Movimento Pró CAPS Ceilândia deveriam ocorrer no próximo ano, pois o final do ano é marcado pelo acontecimento de muitas comemorações, o que dificultaria a participação de um número expressivo de pessoas. Quanto ao abaixo-assinado, até a presente data já foram recolhidas cerca de duas mil assinaturas. É necessário um número maior de adesões frente ao número de habitantes de Ceilândia. Vários atores sociais continuam empenhados no recolhimento das assinaturas. Está prevista a entrega ao governador do DF em 2009, com a participação do Ministério Público, membros da Rede e usuários dos serviços de saúde mental. Na análise da implantação de todos os serviços substitutivos previstos na Política Nacional de Saúde Mental, sabe-se que o Distrito Federal vem empulhando há décadas a efetiva criação destes, tornando-se, assim, um violador dos direitos coletivos da população. Não está atento para o círculo vicioso da exclusão das pessoas com transtornos mentais e não está promovendo ações para a consolidação de um círculo virtuoso da inclusão destes. Porém, observa-se que a existência do movimento pela implantação de todos os CAPS em Ceilândia já reverbera em vários setores da sociedade civil e do Estado.

Histórico de criação da Rede Social de Ceilândia

O primeiro passo na construção da Rede Social da Ceilândia ocorreu em fevereiro de 2008. O SERAV (Serviço de Atenção a Famílias em Situação de Violência) da Secretaria Psicossocial Judiciária do TJDFT, com equipe composta por assistentes sociais e psicólogos, que assessora aos magistrados dos Juizados Especiais Criminais da Ceilândia que atendem as mulheres em situação de violência (Lei Maria da Penha) realizou contatos telefônicos com pessoas de várias organizações públicas e privadas, ONGs, lideranças comunitárias para a um encontro no qual se discutisse a possibilidade de uma articulação em rede na Ceilândia. Por ser a articulação em redes um dos pilares do Programa Justiça Comunitária, de imediato houve adesão a esta iniciativa. Tal proposta teve como objetivos conectar pessoas que tinham interesse em promover ações conjuntas para prevenir e enfrentar a violência/violação de direitos contra crianças, adolescentes, mulheres e homens. O SERAV e o Programa Justiça Comunitária já vinham construindo parcerias em alguns trabalhos, destacando-se o Seminário de Violência contra a Mulher, no qual houve a participação de cem pessoas das cidades de Ceilândia e Taguatinga. A realização deste seminário permitiu que os agentes comunitários se instrumentalizassem quanto aos vários aspectos da Lei Maria da Penha para desempenharem suas atribuições de educadores para os direitos e para promoverem a animação de redes. Embora a experiência seja sempre infinitamente mais rica do que qualquer possibilidade de apropriação pelos discursos, buscar-se-á descrever a história da Rede Social da Ceilândia nesse seu primeiro ano de existência. A reunião inicial foi realizada em fevereiro de 2008 no Centro de Referência Especializado de Assistência Social, órgão da Secretaria de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda do GDF. Dezessete pessoas deram o pontapé inicial no debate acerca da contribuição do trabalho em rede para o enfrentamento dos direitos violados que afetam diretamente os cidadãos da Ceilândia. Importante se faz salientar, que os profissionais do SERAV decidiram realizar essa primeira reunião em um espaço que não fosse o Fórum de Justiça pela representação social do mesmo, como espaço de poder formal e hierárquico. Outro intuito foi não passar a idéia de desejo de centralização, idéia contrária ao trabalho em rede. Segundo Franco (2008, p. 4): “Se uma organização hierárquica (como uma empresa ou uma organização da sociedade civil) estiver convencida de que precisa articular uma rede – até mesmo para iniciar a transição do seu padrão de organização centralizado para um padrão distribuído – a primeira providência é dar autonomia a um grupo de pessoas que vão se organizar em rede para começar a tentar articular a rede desejada.” Neste encontro, o tema conversado foi a possibilidade da construção de um trabalho em rede a fim de romper com as práticas isoladas e criar novas práticas que promovessem a emancipação. Segundo Sousa Santos (2007 apud FOLEY, 2003) as sociedades capitalistas produzem nas suas esferas de relações sociais formas de poder, de direito e de senso comum. Nessas esferas podem tanto acontecer relações de poder, como relações emancipatórias, tendo como base, para essa última, práticas sociais transformadoras. A partilha do poder, a democracia, a prática dos direitos humanos, as relações entre Estado e sociedade civil criam condições hábeis para o exercício da cidadania e de redução das desigualdades sociais. Por considerar que a construção de uma rede na comunidade é uma prática social transformadora muitos atores sociais têm aderido à Rede Social da Ceilândia. Esta adesão de diversos segmentos e a construção de diversas parcerias têm demonstrado que tal caminho é uma realidade possível e, nesse percurso, estão presentes: - Academia de Polícia Civil/ Polícia Comunitária; - Amigos da Paz; - Centro de Atenção Psicossocial/CAPS-AD Guará; - Casa o Cravo e a Rosa; - CEAV - Centro de Atendimento a Vitimas de Violência; - Central Judicial do Idoso; - Centro de Ensino Especial 2 de Ceilândia - Centro de Referência da Assistência Social - CRAS/Ceilândia; - Centro de Referência Especializado da Assistência Social CREAS/Ceilândia; - Centro Marista Circuito Jovem; - Centro Marista Circuito da Criança; - CESAM - Centro Salesiano do Menor; - COMPP - CAPSi - Conselho Tutelar de Ceilândia; - Conselho de Saúde de Ceilândia; - Diretoria Regional de Ensino da Ceilândia / Ouvidoria e Psicopedagógico; - Fraternidade Pobre Katar; - Hospital São Vicente de Paulo; - Hospital Regional da Ceilândia; - Líder Comunitária e Terapeuta Comunitária do Condomínio Novo Horizonte Marieta Soares; - Ministério Público da Ceilândia; - Movimento Integrado de Saúde Comunitária – MISMEC; - Movimento Pró Saúde Mental do DF; - Ocip – Ecoatitude – Ações Ambientais; - Ocip – Valor Ambiental; - Paróquia Nossa Senhora da Assunção; - Pastoral Social Paróquia Nossa Senhora da Assunção; - Programa Justiça Comunitária / TJDFT; - Programa “De volta para Casa”/ Secretaria de Saúde; - Secretaria de Saúde / Ceilândia; - Secretaria de Estado de Justiça de Direitos Humanos e Cidadania; - Serviço de Atendimento a Família em Situação de Violência – SERAV/ Secretaria Psicossocial Judiciária - SEPSI/ TJDFT; - Serviço de Atendimento ao Usuário de Substâncias Químicas – SERUQ/Secretaria Psicossocial Judiciária - SEPSI/ TJDFT. É preciso atualizar TODAS instituições/entidades Já na primeira reunião os participantes decidiram realizar mensalmente encontros da Rede Social da Ceilândia em diversas entidades da cidade, a fim de estabelecer uma constituição relacional de pessoas e contextos. Até o mês de janeiro de 2009, os encontros foram realizados nos seguintes locais: - A Casa O Cravo e A Rosa (Secretaria de Justiça e Cidadania), localizado na Ceilândia Centro; - Fórum da Ceilândia (TJDFT), localizado na Ceilândia Centro; - Circuito Jovem Marista, localizado no P Sul; - Igreja Evangélica, localizada no Condomínio Pôr do Sol; - Igreja Pentecostal ELIM, localizada no P Norte; - Paróquia Nossa Senhora da Assunção, localizada no P Sul (por duas vezes); - Centro de Ensino Médio 2 (Secretaria de Educação), localizado na Ceilândia Oeste; - Hospital Regional da Ceilândia (Secretaria de Saúde), Ceilândia Centro; - CESAM (Centro Salesiano do Menor), localizado na Ceilândia Norte; - Igreja Nossa Senhora Aparecida, P Sul; - Prefeitura do P SUL; - Centro Marista Circuito da Criança; Partindo do pressuposto que uma rede é um processo de captação, articulação e otimização de energias, recursos e competências, capaz de gerar um sistema de relacionamentos que organiza indivíduos e instituições de forma igualitária e democrática, em torno de um objetivo ou agenda comum de caráter público, ao longo dos encontros mensais, construiu-se como finalidades iniciais da Rede Social da Ceilândia: - Viabilizar a interação, a integração e a ação conjunta entre as distintas entidades e atores sociais; - Valorizar a participação social de diversos atores sociais; - Trocar experiências, compartilhar informações; - Possibilitar à comunidade maior conhecimento de seus direitos; - Garantir os direitos da comunidade; - Atuar como força política junto ao governo; - Criar parcerias; - Incorporar as lideranças na rede; - Fortalecer os movimentos sociais; - Incrementar a participação comunitária; - Apoiar a reinvenção da comunidade por meio do exercício de novas práticas que criem solidariedade. No decorrer dos encontros, as pessoas vão se conhecendo, combinando projetos, criando possibilidades de se articularem através das novas relações sociais autônomas e horizontais, gerando parcerias concretas de trabalho em redes flexíveis e inesgotáveis. Representantes da equipe multidisplinar, principalmente os assistentes sociais - pela ampla compreensão do significado do trabalho em rede - e alguns agentes comunitários do Programa Justiça Comunitária vêm participando de todos os encontros. Esta experiência possibilita que os agentes comunitários se integrem para interagir com diversos elos da Rede Social da Ceilândia e, assim, conhecer melhor os recursos, potencialidades e necessidades da própria cidade onde residem. Nesse primeiro ano, aconteceram várias parcerias: a participação de uma agente comunitária de justiça e cidadania no grupo de relações do SERAV (com o objetivo de divulgar a Justiça Comunitária e explicar a proposta de resolução pacífica de conflitos, através da mediação pelos agentes comunitários da própria comunidade); a implantação de um grupo de Terapia Comunitária, pela líder Comunitária Marieta Soares na Casa o Cravo e a Rosa para atender aos familiares dos jovens; a oferta de um espaço dentro da instituição Casa o Cravo e a Rosa para a instalação das atividades do CEAV – Centro de Atendimento a Vítimas de Violência; criação de um canal de comunicação entre o HRC e o Circuito Jovem Marista para viabilização de uma ação conjunta para acompanhamento médico das crianças e jovens atendidos pela entidade; atendimento conjunto de uma família em situação de miserabilidade pela Paróquia Nossa Senhora Assunção, CREAS e Conselho Tutelar; a disponibilização pelo MISMEC (Movimento Integrado de Saúde Comunitária) de quatro bolsas para a formação de agentes comunitárias de justiça e cidadania em Terapia Comunitária (a formação em Terapia Comunitária favorece a animação da rede social da Ceilândia, pois os agentes comunitários são efetivamente membros da comunidade. O quê beneficia a eles próprios beneficia a comunidade, gerando empoderamento e coesão social); as assistentes sociais da Divisão Regional de Saúde de Ceilândia propuseram uma discussão para que o grupo de teatro do Programa Justiça Comunitária faça esquetes sobre direitos - idosos, crianças, saúde – para apresentação nos centros de saúde e hospitais; etc.